Uma palavra tem sido corriqueiramente pronunciada, ouvida e reproduzida nas ações da Secretaria de Segurança Pública do Estado do Rio e esta palavra é TERRITÓRIO.
Em momentos como esses, vividos hoje na cidade do Rio de Janeiro, é natural que os estudiosos e pesquisadores da área de Segurança Pública se manifestem, seja tanto para ajudar a população a entender as ações, assim como para contribuir, de maneira reflexiva, para identificar quais são os pontos nevrálgicos, caminhos e desafios da Segurança Pública.
Concordo com estas afirmações, de fato não podemos pensar ações de segurança pública somente como ações de polícia, mas esta não me parece ser a questão central que é a base da ocupação do Complexo do Alemão.
Esses outros pontos que devem ser contemplados, dentro de uma política de segurança pública, já estão colocados em um série de documentos, artigos, debates e ninguém está contradizendo nada disso.
Peço minhas desculpas antecipadas aos estudiosos da categoria sociológica "violência", mas desconsiderar a variável espacial, neste momento, limita o alcance das análises, e como geógrafa me uno aos policiais e militares desta ação, afinal como já dizia Yves Lacoste "A Geografia – isso serve, em primeiro lugar, para fazer a guerra".
O que acontece hoje no Rio, na minha humilde percepção, também apoiada e construída com base na experiência e em estudos, é a retomada de territórios e espaços urbanos que conferiam vantagem tática aos grupos criminosos.
Esta ação não é a "solução definitiva" contra os grupos criminosos e nem vejo a Secretaria de Segurança Pública apresentá-la assim. A palavra é "retomada de território", e por que retomar território é tão importante?
Porque muito antes de existir polícias e de se pensar em políticas de Segurança Pública, há 5 séculos já se sabia o valor de conquistar espaços enquanto instrumento de manutenção, conquista e exercício de poder.
Sun Tzu disse, no seu badalado "A arte da Guerra" que: "A conformação do terreno é de grande importância nas batalhas. Assim sendo, apreciar a situação do inimigo, calcular as distâncias e o grau de dificuldade do terreno, quanto à forma de se poder controlar a vitória, são virtudes do general de categoria. Quem combate com inteiro conhecimento destes fatores vence, de certeza; quem não o faz é certamente, derrotado" .
Para quem ficar desconfortável com a citação de Sun Tzu - pois a China dele, e até hoje de certa forma é um regime autoritário, de ausência de direitos civis - podemos então lembrar do General Prussiano Carl von Clausewitz, entre outros estrategistas.
Os traficantes ocupam os espaços que podem lhes fornecer uma vantagem tática e estratégica para alí permanecerem, e não é gratuita a denominação ilustrativa de "bunker", "porto seguro", "fortaleza", dentre outros adjetivos para denominar esses espaços.
Retirar os territórios do tráfico é retirar sua vantagem tática, que é fornecida pela característica do espaço concreto das áreas conhecidas como "favelas", onde a desordem da sua arquitetura permite isso. Por isso é tão fundamental o apoio das forças armadas por possuírem equipamentos (vantagem de método) que minimizam a vantagem de comandamento do terreno, que é o que está sendo tomado dos traficantes.
Quem já assistiu o filme 300, viu a vantagem que a geografia das Termópolis deu aos espartanos que, com um número inferior de tropas, resistem durante dias a um exército infinitamente mais numeroso.
Ocupar o complexo do Alemão irá acabar com a venda de drogas naquela região? Não, pois a territorialidade do tráfico de drogas é uma territorialidade flexível, descontínua e funcional. Irá existir onde houver mercado.
Ocupar o complexo do Alemão vai acabar com a violência? Sim, se o Estado entender que reintegrar este território é levar à comunidade a cidadania de forma completa com: justiça (defensoria pública, mediação e conciliação de conflitos), segurança (pronto-atendimento das chamadas emergenciais, polícia comunitária, delegacias convêncionais e especializadas) saúde, educação, cultura e lazer para aquela comunidade.
Polícias são forças territorializadas e poder contar com a presença delas em qualquer lugar da cidade não é, necessariamente, garantia de uma cidade segura e igualitária no acesso aos serviços públicos, mas já é um excelente começo para o Rio retomar o que o carioca mais deseja: o título de Cidade Maravilhosa.
(Fonte: Marcelle Gomes Figueira - Luis Nassif online. Imagem de traficantes em fuga da Vila Cruzeiro - RJ: Rede Globo)
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