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segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

FORTALEZA: CONSTRUÇÃO COMUNITÁRIA, SEGURANÇA PÚBLICA, POLÍCIA MILITAR DO CEARÁ E MILÍCIAS II

Continuando a discussão a respeito da temática, em face do que foi postado neste blog no sábado, 7 de fevereiro do corrente ano, é coerente uma breve análise do processo sócio-político-econômico universal, chegando a contemporaneidade, pois tanto o princípio social como o comunitário atravessaram as sociedades e os tempos.
À medida que foram seguindo, os processos social e comunitário da humanidade, foram marcados por múltiplos acontecimentos que contribuíram para sua estruturação.
As “sociedades de massa” formaram as concentrações populacionais em virtude de fatores como o da industrialização e da urbanização, como aconteceu na Inglaterra no período da revolução industrial, e o que como aconteceu na América do Norte, Europa, parte da Ásia, Norte da África e Oceania após a Primeira e Segunda Grandes Guerras Mundial, bem como estamos vivenciando nesta ERA, neste mundo globalizado.
Várias correntes filosóficas, antropológicas, sociológicas, geo-políticas, dentre outras, apontam teorias para explicar as transformações que vêm acometendo nossa humanidade. Em determinados momentos explicam isso através de algumas obviedades, em outros momentos, através de situações inusitadas ou inesperadas.
Entretanto, afora tudo o que já discutimos na postagem anterior (I), é de bom alvitre entendermos que na realidade, enquanto seres humanos, temos necessidades que nada melhor que a vida em comunidade para entender por que o gênero humano necessita da vida social e comunitária, e de regras que possam tornar essa experiência numa realidade mais paupável, possível e próxima do ideal. Necessidade e salvaguardas, desde a elementar sobrevivência aos conteúdos como a amizade, a intimidade, a partilha da vida e as relações pessoais que comprovam o distanciamento do isolacionismo radical.
A própria família surge como o modelo de vida comunitária. E a idéia de comunidade se estende a vizinhança do bairro, ao grupo social, chegando-se a transpor para âmbitos mais abrangentes.
Mesmo nas formas mais rudimentares de convivência, a sociedade tem um fundamento último na chamada “natureza humana, definida como feixe de necessidades básicas do homem – muito mais complexos neste que nos animais irracionais – às quais deve satisfazer, se não quiser perecer”.
Todo ser humano tem necessidade de respirar, dormir, alimentar-se, abrigar-se e uma série de outras necessidades, próprias de seu organismo físico. Algumas ele pode satisfazer individualmente. Outras, porém, as mais importantes, por sinal, só poderão ser supridas em sociedade, como a procriação (ligada à perpetuação da espécie), a segurança e a alimentação (ligados à sobrevivência).
É, portanto, a “natureza humana” o primeiro impulso que levaria o homem a formar grupos organizados e permanentes. É também neste sentido que se deve entender a afirmação de Aristóteles, segundo o qual o “homem é um animal político”, ou seja, é um animal sociável, incapaz de existir a não ser em sociedade, na cidade, na “polis” – expressão mais avançada de organização do grupamento humano.
Assim, complementando os estudos iniciados na parte I, quando fizemos uma incursão histórica da sociedade local, observando a Fortaleza de ontem e de hoje e entendendo a inserção da Polícia Militar do Ceará no contexto, ouve-se por bem fazermos os comentários anteriores, para entendermos que a vida social de Fortaleza, erguida diferentemente das conseqüências das guerras, foi pungida pela saga dos conquistadores, dos desbravadores, dos dominadores, dos exploradores... das necessidades de estabelecerem seus domínios e a sí próprios.

Contexto Social local

O contexto social local não é mais tão bucólico e ameno. Pois mais do que nunca, principalmente na vida cotidiana, o social vem acompanhado do político, mas principalmente do econômico. Estes fatores impingem múltiplas mudanças numa sociedade e Fortaleza não é exceção. O contexto social local foi modificado por conseqüências derivadas destes fatores, senão vejamos.
O contexto social mudou, como mudou a geografia de Fortaleza. Os limites urbanos ultrapassaram a então eqüidistante Av. Perimetral. Seus conjuntos habitacionais, não restringem-se mais ao José Walter e Cidade 2000. Os terminais de ônibus espalham-se pela cidade. O comércio “24 horas” é uma realidade, são Farmácias, restaurantes, “fast food”, motéis, supermercados, biroscas com venda de bebida alcóolica, postos de combustíveis e suas lojas de conveniência, locadoras, caixas eletrônicos, academias, dentre outros.
Imensas áreas novas, destinadas ao lazer, à cultura, à concentração de pessoas, como o Parque do Cocó, o Centro Cultural Dragão do Mar, tomaram os espaços tranqüilos do então Passeio Público.
As Praias de Iracema e Beira-Mar, fervilham. O centro comercial cedeu lugar, e ao que parece perdeu em encantamento, para os “shopping”.
Dispomos do Castelão, maior que o “PV” e de um novo aeroporto.
Universidades, estabelecimentos privados de ensino...
Os números tornaram Fortaleza na 4ª cidade do Brasil:
Mais de setecentos mil automóveis e motos;
Mais de seiscentas favelas;
Dezenas de linhas de ônibus, rádio-táxi, moto-táxi e transportes alternativos;
A cidade vive com novos costumes, com uma vida noturna intensa, inclusive presença de “gangues” e MILÍCIAS. Uma Região Metropolitana “inchada” e problemática. Múltiplos acessos rodoviários, viários e até um metrô em construção. Prédios colossais, condomínios de luxo, parques aquáticos, turismo intenso.
A cidade ficou dinâmica e o trânsito foi municipalizado.
Novas práticas, costumes, tecnologias e negócios. Convivemos com diversos canais de TV (VHF, UHF, à Cabo), rádios (AM e FM) e jornais. Estamos convivendo com o computador e a internet, a telefonia móvel – celular, a era dos cartões de crédito, do vale transporte e muito mais.
Estamos vivendo a época do TER x o SER.
Estabeleceram muros entre a pobreza e a riqueza, mas que foram ultrapassados. Temos hoje uma grande leva de pobres buscando a sobrevivência nos cobiçados espaços ricos. Aqueles que não competem “tomam” literalmente (roubos a pedestres, principalmente de celulares é uma rotina estarrecedora), estabelecendo-se os conflitos. Como falta distribuição de renda e oportunidade de equilíbrio social com indicadores políticos e econômicos mais sólidos e igualitários, as conseqüências drásticas desse processo conduz uma gleba ao crime, à miséria e à exclusão social sem expectativa.

Necessidades de segurança e controle social

A Polícia Militar do Ceará, como vimos anteriormente na Parte I, foi criada em 24 de maio de 1835.
Ao longo dos anos sofreu algumas transformações, entretanto, muito mais nas denominações, do que nas formas estruturais e culturais e de postura face aos anseios e aspirações da comunidade.
Assim, é que a partir da Constituição de 1934 e da Lei Arruda Câmara em 1936, quando as Polícias Militares passaram ao rígido controle do Exército Brasileiro, centraram mais ainda suas ações na defesa do Estado, das Instituições, dos Poderes, ou seja na manutenção/preservação do Governo e do “status quo”.
Em 1969, com a extinção das Guardas Civis, de Trânsito e Rodoviárias, suas ações foram englobadas pelas Polícias Militares.
Por força de atuação, a Polícia Militar mostrou-se eficaz, eficiente e efetiva na defesa do Estado, agindo como Polícia de Ordem Pública Institucional. Montada numa estrutura lenta, própria mais para enfrentar os inimigos do poder (“grevistas”), do que os inimigos da comunidade: a violência cotidiana e o crime organizado.

Mecanismo de controle social

O controle social é expresso sob a forma de normas de conduta, que determinam padrões e valores, que a sociedade considera “normal”, “bom”, “direito”.
O conceito de controle social é muito amplo. Incluem desde as regras de civilidade, normas de trato e etiqueta até as normas coercitivas do direito. As instâncias ou instituições sociais encarregadas de seu exercício são também numeradas e vão da família às penitenciárias.
Costuma-se fazer distinção entre controle social formal e o informal. O controle social formal é constituído por normas escritas de comportamento, como os regulamentos, os estatutos e a lei – o mais formal de todos os mecanismo de controle social.
Os informais são representados pelos costumes grupais, hábitos regionais e usos.
A Polícia Militar não deve ser apenas um instrumento de controle social subjetivo, que através da sua presença ostensiva, fardada, inibe o afloramento de desvio de condutas.
A grande realidade, é que por vezes, a Polícia Militar tem agido no vácuo social (conduzindo débeis, auxiliando parturientes, “mandando circular” mendigos, “flanelinhas, desempregados, coibindo “piquetes”, etc.), e assim, obviamente, é incompreendida, porque é a que está presente para “inibir”, “controlar”, “prender”, ante a ausência de “ESTADO”, tornando-se até odiada, principalmente quando o excesso acontece.
A Polícia Militar devido a seus parcos recursos, falta de efetivos e meios, de legislação atual, com centralização, encampamento pela Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social e por outros órgãos do Estado, como a Procuradoria Geral do Estado (Comissão Central de Licitações), que tornaram-na mais inerte ainda, tem atuado muito mais em cima do que a comunidade entende como conseqüências (atendendo ocorrências, preservando local de crime, executando tarefas de guarda nos poderes ou nos presídios), do que no policiamento, ou seja, na prevenção, fazendo policiamento preventivo, na antecipação ao crime - causa.

O indivíduo em comunidade

O indivíduo socializado, o contrário, portanto, do “homo ferus”, é aquele que se comporta segundo as normas e cânones estabelecidos pela sociedade. A partir do instante em que o indivíduo é recebido no grupo, seja pelo nascimento, seja pela imigração, surge, então, sua evolução em comunidade. Vejamos o que dizem a respeito, renomados autores: “Sabemos que nenhum organismo sobrevive sem equilíbrio. A comunidade é um organismo e o homem seu fator de equilíbrio. Porém, este, para manter seu equilíbrio pessoal e concorrer para o equilíbrio comunitário, necessita de segurança”.

Contexto Comunitário local

Assim, como a necessidade de confortos corporais tem uma resposta cultural, o aparecimento do arado, da carroça, da casa de alvenaria, do automóvel, etc, e todo o conhecimento que torna possível a fabricação desses objetos, a necessidade de segurança, enseja como resposta cultural, a criação de mecanismos que podem ser, genericamente, designados de controle social.
Conforme se sabe, a segurança refere-se a danos corporais, ou acidente mecânico, "ataque por parte de animais" ou outros seres humanos. O grupo não sobreviverá se não estiver protegido contra riscos reais ou potenciais aos bens mencionados.
Normalmente, a sociedade política e eficiente proporciona a seus membros bastante segurança, protegendo-os de “animais selvagens”, crimes, assaltos, assassinatos, etc.
O conceito de segurança como conjunto de medidas visando a eliminar riscos é uma constante em todas as sociedades, desde as mais primitivas até as mais avançadas.
Todos os povos parecem distinguir os perigos em dois grupos fundamentais:

- Os naturais, representados por perigos oriundos da própria natureza ou outros agentes inanimados ou irracionais. Tais são a construção de casas sobre estacas em lugares sujeitos a inundação;

- Os Humanos, representados por indivíduos ou grupos de pessoas. Podem se subdividir em agentes externos (tribos, nações e clãs inimigos) ou agentes internos (criminosos, malfeitores, pessoas do próprio grupo considerado).

Contra os inimigos externos a defesa pode ser física, como a construção de barreiras. Contra os agentes do próprio grupo, a defesa se faz, sobretudo, através de mecanismo de controle social.
Em Fortaleza, mais recentemente, a idéia de Polícia Comunitária surgiu nos idos de 1987, muito embora os mais “antigos” digam que as famosas duplas “Cosme e Damião”, faziam o verdadeiro policiamento comunitário. Mas será que naquela época o Estado e as instituições sociais não eram mais rígidas, a família, a igreja, a escolas? Ou a Polícia era melhor, mais comunitária?
Debates à parte, o então Comandante Geral da Polícia Militar do Ceará, Cel PM José Israel Cintra Austregésilo, implantou no Governo Tasso Jereissati, os EXCELENTES Policiamentos Comunitário e Setorial, complementados pelos Conselhos Comunitários de Segurança e o Projeto “PM a Seu Serviço” (dourina de Polícia Comunitária).
Oficiais como o saudoso CEL PM Carlos Alfredo da Rocha, CEL PM Francisco Eudório Fernandes, CEL PM Francisco Tarcísio Forte da Silva, e os então Tenentes Adail Bessa de Queiroz, Carlos Alberto de Oliveira, Djair José Silva Mendes, Ivonildo Otaviano de Castro, Francisco Tarcísio da Silva e Coraci Camelo Postes, dentre tantos outros oficiais, participaram do planejamento, implantação e execução do Policiamento Comunitário.
A primeira comunidade de Fortaleza a ser assistida pelo policiamento comunitário foi a da Parquelândia, posteriormente outras foram assistidas, a saber: Jardim Iracema, Cidade dos Funcionários, Serrinha, Parque São José, Henrique Jorge, Monte Castelo, Varjota, Montese, Antônio Bezerra e Pirambu. Já a experiência dos Conselhos Comunitários, começou pelo Henrique Jorge.
No Comando do CEL PM Hamilton Rocha Barroso, o projeto foi novamente revigorado, depois de uma época de rediscussão e solução e continuidade no Comando do Cel PM Danilo Tomaz.
Por falta de solução de continuidade, e algumas denúncias de utilização do projeto para fins “eleitoreiro”, haja vista pelo menos três dos então Comandantes da época haverem lançado candidaturas, o projeto perdeu força.
Em 1995, o Policiamento Comunitário renasceu com o SINDES – Sistema Integrado de Defesa Social, do então Vice-Governador Moroni Bing Torgan, para a partir de 1997 ser encampado pela então Secretaria da Segurança Pública e Defesa da Cidadania, na gestão do General Cândido Vargas de Freire, que criou uma Diretoria para implantar uma mentalidade de Polícia Comunitária, hoje alcançando um número superior a mil Conselhos Comunitários de Defesa Social em todo o Ceará.
Ocorre, que a falta de meios materiais, humanos, de gestão de continuidade e de uma legislação atual e forte para o setor - um novo Código Disciplinar (só foi editado em 2003), uma nova Lei de Fixação de Efetivo (só saiu em 2005), um novo Estatuto (só saiu em 2006, modificado duas vezes e ainda repleto de defeitos) e uma Lei de Organização Básica que até hoje não saiu, fez com que a Polícia Militar do Ceará se tornasse um “CORPO SEM CABEÇA”. Ademais, a legislação a respeito de Polícia Comunitária se restringiu a meros Decretos, como os de nº 18.411, de 09 de fevereiro de 1987, de nº 24.399, de 12 de março de 1997 e de nº 25.293, de 11 de novembro de 1998, que ainda não deram sustentação a essa nobre idéia.
Resultado: a segurança pública, principalmente através de sua “viga mestra”, o Policiamento Ostensivo Preventivo da Polícia Militar do Ceará, não foi capaz de atender às demandas de segurança da comunidade Cearense, principalmente de Fortaleza, daí, no vácuo, nasceram as atuais MILÍCIAS, que em bairros como o Bom Jardim, vem provocando a cada ano, dezenas de crimes, principalmente os estarrecedores homicídios.

Na Parte III iremos concluir a temática.

Fonte:
- Ensaio Estatístico da província do Ceará;
- CPD-CIOPS, até a data pesquisada;
- Percepção social das comunidades de Fortaleza - Seus anseios e aspirações face à postura da Polícia Militar do Ceará. Autoria: lima, P. A. da S. et Paula Neto, F. C. – Orientação: Adail Bessa de Queiroz.

Notas
(1) - Cf. Mapa Estatístico do Estado do Ceará;
(2) - In: O gene egoísta. São Paulo, ed. USP, 1979, p. 190-191.

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